História da Arte Potiguar: Arquitetura Neoclássica

Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares

O Romantismo é normalmente associado a apenas um movimento literário, porém ele é mais que isso, ele faz referência a toda uma nova abordagem filosófica e estética da vida que entrou na moda no século XIX, com a meteórica ascensão do pensamento iluminista. Uma das características que o Iluminismo pregava era a razão, esta era representada pela a aparente falta de paixão dos homens gregos com suas construções brancas e retilíneas (aparente porque, na verdade, as esculturas gregas eram coloridas e cheias de vida, elas eram tingidas e perderam a cor com o tempo). A oposição a isso era a decoração exagerada e cheia de curvas da arte barroca. Então, quando o Iluminismo chega ao poder, especialmente depois da Revolução Francesa, seus ideais são defendidos não somente entre os filósofos, mas também entre os artistas e, em especial, pelos arquitetos.

As cidades começam a derrubar seus monumentos barrocos, considerados símbolo de atraso e de superstição. O mundo romântico é centrado no historicismo e no individualismo, ele se coloca como extremamente rebelde e repudia as regras instituídas (políticas, filosóficas e artísticas), que consideram arcaicas, antigas, desatualizadas. O objetivo agora é trazer o novo, o progresso, a modernidade e passam a construir novos prédios, novas construções que seguiriam um estilo que será chamado de Neoclássico, o novo clássico, porque fazia referência as construções greco-romanas do passado, que era agora símbolo desta racionalidade. Um famoso exemplo desta ligação entre filosofia, política (este é a arte da Revolução, é a arte de Napoleão Bonaparte) e arte é a construção da cidade de Washington, nos EUA, e de prédios como o Capitólio e da Casa Branca.

A arte romântica chega ao Brasil com a transferência da família real, fugindo de Napoleão, de Lisboa para o Rio de Janeiro. Ao se tornar corte do Império, Dom João VI abriu a Escola de Belas Artes e trouxe artistas franceses para dar as primeiras aulas. A chegada da "Missão Artista Francesa” estabeleceu o tom da arte brasileira a partir daquele ponto. Auguste de Montigny foi o arquiteto que introduziu esta nova forma de construir e pensar a cidade, e ela ainda continua se mantendo pelo menos até 1920, quando o modernismo assume. No Rio Grande do Norte, este estilo arquitetônico é um dos mais utilizados, ele aparece em várias cidades como Natal, Ceará-Mirim, São José do Mipibu e Nísia Floresta.

A curiosidades sempre incita mais perguntas: por quê, no Rio Grande do Norte, temos mais construções Neoclássicas do que Barrocas? A resposta está relacionada com a economia do açúcar. A partir do século XIX, os engenhos de açúcar se expandiram por toda região agreste do Estado, essa produção injetou capital nas cidades que citamos e isso permitiu que houvesse dinheiro para a construção de igrejas e prédios do governo.

A arquitetura neoclássica se caracteriza pelo uso de fachadas sóbrias, com colunas dóricas ou jônicas, ou com grandes arcos, que sustentam frontões triangulares e decoração horizontalizada da fachada. A simetria também é um elemento importante, com a repetição dos elementos decorativos a esquerda e a direita, reforçando a horizontalidade. As construções também tendem a ter a forma retangular com volumes maciços de grandes paredes lisas. Um elemento muito usado são abóbadas e cúpulas.

O mais antigo prédio neoclássico potiguar está em Nísia Floresta: a Igreja de Nossa Senhora do Ó. Ele começou a ser construído em 1703 e terminou em 1755. A igreja possuí uma fachada principal coroada com um frontão triangular com uma rosácea no centro. Possui três portas na entrada semiarqueadas e três janelas com guarda-corpo iluminam o coro. Ela é ladeada com duas torres sineiras quadradas, com teto quadrado, sem balustrada, mas com pináculos. As torres possuem também porta e janelas com guarda-corpo, porém com balaústres de madeira. As colunas imitam bases e capiteis dóricos, mas são quadradas. O interior da igreja tem o chão de ladrilhos hidráulicos, e a parede decorada com retábulos com detalhes em ouro.

O segundo prédio neoclássico mais antigo do Rio Grande do Norte está em São José do Mipibu: a Igreja Matriz de Santanna e São Joaquim. Ela começou a ser construída em 1740, por frades capuchinhos, e ela foi terminada em 1762. Ela também possuí a faixada principal coroada com um frontão triangular. A faixada principal tem também três portas, em abertura quadrada, levemente ovalada, com três janelas com guarda-corpo no coro. A igreja é ladeada por duas torres quadradas, que são encimadas por uma balustrada (que é característica do neoclássico) e também uma cúpula triangular (que já é um acréscimo neogótico). Interiormente a igreja possuí arcos que dividem a nave central das naves laterais e seus retábulos não possuem muitos ornamentos (deixando isso apenas para os capiteis das colunas).

Em Natal, um exemplo desta construção neoclássica é o Palácio Potengy, que já foi prédio do governo estadual, e agora funciona como pinacoteca. Construído entre 1865 e 1873, ele já é do período mais tardio do Romantismo Neoclássico. O projeto é do engenheiro bahiano Ernesto Augusto Amorim do Vale e tinha como objetivo inicial abrigar o tribunal e a assembleia legislativa da província, mas já em 1902 passou a abrigar o governo republicano. Foi sede do governo estadual até 1995, quando este foi transferido para o Centro Administrativo em Lagoa Nova. Suas características neoclássicas mais importantes são a fachada principal coroada com frontão triangular, ela tem três portas em vãos em arco pleno, enquadrado por cunhais e colunas, no andar superior e nas laterais temos janelas de vergas retas. O prédio, com dois pavimentos, é retangular e explora a horizontalidade, e as inúmeras janelas são espelhadas a direita e a esquerda, criando um aspecto simétrico. As janelas superiores possuem guarda-corpo de ferro batido e sacada corrida na parte central. O telhado é de quatro águas com platibanda corrida. As fachadas laterais, possuem no pavimento inferior, janelas de vergas retas e porta central, e no centro do pavimento superior, três janelas rasgadas com balcão corrido, existindo outras duas janelas laterais com balcões. Em seu interior, podemos destacar o gradil de madeira e a escada.

Um segundo prédio neoclássico encontrado em Natal é o atual Memorial Câmara Cascudo. Ele foi construído em 1875 para abrigar a Tesouraria da Fazenda Imperial, substituindo o prédio do Real Erário, e até 1955 manteve funcionando a Delegacia Fiscal, órgão do Ministério da Fazenda no Rio Grande do Norte. A partir daí, ele foi cedido ao exército, abrigando seu quartel general no estado até 1982, e, cinco anos depois, ele tornou-se o Memorial Câmara Cascudo, que por iniciativa do jornalista Paulo Macedo, visava preservar e divulgar a obra do folclorista Luís da Câmara Cascudo. Ele guardava sua biblioteca, porém com a criação do Instituto Ludovicus, pela família do folclorista, o material retornou a guarda dos Cascudo.

O prédio tem como principais características neoclássicas a sua horizontalidade e simetria. Os elementos que se apresentam neste plano retangular que é a sua fachada se repetem simetricamente dos dois lados. Mesmo as suas portas de entrada, que são separadas por duas janelas, tem um espelhamento simétrico de uma para a outra. Com duas portas de entrada, o prédio também apresenta dois frontões, de menor tamanho do que é comum, mas triangulares como o estilo exige. As janelas e as portas são quadradas, porém tem cornijas acima de cada uma delas. As janelas do pavimento superior possuem todas guarda-corpo de metal.

Memorial Câmara Cascudo (foto: agorarn.com.br)

Memorial Câmara Cascudo (foto: agorarn.com.br)

Mais um prédio neoclássico encontrado na capital é o prédio do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. O palacete construído em 1906 e ele ainda segue os padrões românticos. Diz Débora Luna: “Implantado no alinhamento da Rua da Conceição, o prédio apresenta um partido de planta retangular, fachadas com traços e características neoclássicas, com frontões curvos e triangulares - com uma distribuição que busca a simetria - platibanda com balaustrada, arrematando o coroamento das paredes e esquadrias em madeira e vidro. Uma das características marcantes à época da sua construção foi o acesso que se dá pelas laterais valorizado pelas escadarias que lhe dão imponência” (LUNA, 2016).