As Fortalezas do Rio Grande do Norte: Os Quatro Presídios

Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares


Uma das formas de fortificação construídas na história potiguar são os presídios. Contudo, presídio não tinha o sentido que temos hoje, como sinônimo de prisão e penitenciária. Os presídios eram acampamentos ou colônias militares, praças fortificadas, em que soldados ficavam aguardando entre os confrontos. No Rio Grande do Norte, nós temos três presídios que se localizam todos a noroeste do estado, além de um na ribeira do Assu, todos relacionados com a expansão da colonização portuguesa para o Sertão, e a reação indígena conhecida como Guerra dos Bárbaros.


Presídio do Assu

Este foi construído por Bernardo Vieira de Melo, um capitão-mor pernambucano que governou o Rio Grande durante os anos de 1695 até 1709. Ele foi convocado para combater aos janduís, durante a Guerra dos Bárbaros, graças a sua experiência na guerra contra os quilombolas em Palmares. O presídio é construído, provavelmente em 1697, como base para receber as tropas e para manter a segurança dos colonos. Bernardo Vieira, no entanto, não permanece muito tempo no presídio que ele fortifica, o capitão-mor precisa retornar a Natal e deixa Theodozio da Rocha como capitão da fortificação.

A carta que Bernardo Vieira envia ao rei explicando a escolha de Theodózio da Rocha como capitão diz que este era respeitado e amado pelo gentio e, por isso, seria capaz de instituir uma paz entre os súditos do rei e os nativos. Vieira defendia o que era chamada de “guerra defensiva”, no qual os soldados portugueses não atacavam os nativos, apenas protegiam os colonos quando necessário.

Contudo a política muda com a chegada de Manoel Álvares de Morais Navarro junto ao terço de paulistas. Os paulistas recebem ordens de atacar os indígenas e extingui-los, não apenas garantir a paz entre as populações; Bernardo Vieira demonstra ser contra essa nova política da coroa, porém incentiva inclusive tanto Theodozio quanto seu filho primogênito, André Vieira de Melo, a participar do combate.

Numa carta, também se afirma que o presídio do Assu e seu capitão, Theodózio da Rocha, era imprescindíveis para a vitória contra os indígenas revoltosos. Segundo Patrícia Dias, eram os homens aquartelados no Assu que conheciam o terreno e o inimigo indígena, sem esse conhecimento os paulistas não conseguiriam vencer a guerra. Por isso em 1699, Rocha recebe a patente de capitão da companhia de Antônio Raposo Barreto, entre os paulistas.

A primeira batalha dessa nova tropa se dá em julho de 1699, quando eles marcham até a ribeira do Jaguaribe, no Ceará, para atacar os paiacu no que ficou conhecido como Massacre do Jaguaribe. Eles primeiro chegaram a aldeia liderada por Matias Peca, os quais eram aliados dos portugueses, e seguiram para a aldeia de Jenipapoaçu. Entre estes foram recebidos como amigos, os nativos fizeram um banquete para recebê-los e durante a festa, Navarro atirou no irmão de Jenipapoaçu. Isto foi o sinal para todos os homens do terço matarem o gentio, tanto aqueles que eram da aldeia aliada de Matias Peca, como aqueles que viviam junto a Jenipapoaçu.

Quatrocentos homens e mulheres pereceram e, aproximadamente, trezentos foram capturados e escravizados. Estes indígenas foram levados para o que ficou conhecido como Missão de São João Batista do Apodi, a qual em outubro do mesmo ano, foi atacada por um grupo janduí. Os paiacu, no entanto, combateram os janduís, seus inimigos, resultando na morte de 73 homens, e a captura de 80 guerreiros.

Após o Massacre, a presença de Theodózio da Rocha no presídio se tornou ainda mais necessária. Ele tentou pedir afastamento, em 1703, porém este foi negado. A violência crescia com as ações dos paulistas no sertão, e era preciso um capitão que soubesse como apaziguar as coisas com os nativos. Em 1712, eles são convocados, agora por José de Morais Navarro, para marchar até Mossoró, para proteger os moradores da região de um possível levante indígena. Theodózio da Rocha vai acompanhado de seu filho Bonifácio da Rocha Vieira, que servia como seu capitão. Eles acampam na fazenda Monxoró, perto da Missão do Apodi. Os documentos relatam as tentativas do capitão do presídio para estabelecer as pazes com os janduís e os caboré antes de qualquer ataque.


Presídio do Mossoró

O presídio se localizava na barra do rio Mossoró, hoje no município de Areia Branca. E faz parte do esforço português de controlar o sertão, em especial a região entre os rios Açu e Jaguaribe (no Ceará), que se inicia no começo do século XVIII.

Como a principal justificativa alegada pelos sesmeiros para realizar os seus compromissos ao receber as semarias (mandar medir, demarcar, povoar e cultivar) era a violência dos nativos, especialmente durante a Guerra dos Bárbaros, foi preciso levar para essa região algumas colônias militares para garantir a proteção dos portugueses.

No caso de Mossoró, até 1709, nenhum sesmeiro teria conseguido sequer estabelecer moradia na região (Patrícia Dias encontrou em sua pesquisa sobre a povoação da região cinco doações que foram consideradas “devolutas por abandono”), por isso era importante para essa região a criação deste posto militar. Para saber o que são sesmarias veja aqui.

O primeiro problema a vencer nessa região era a incerteza de quem era responsável pela administração do território. Não se sabia se essa região pertencia ao Rio Grande ou a província do Siará (atual Ceará). Até 1680, o limite do Rio Grande era o rio Açu, todavia os capitães-mores da província acabaram doando terras a sesmeiros na região que deveria ser administrada pelos cearenses, ao mesmo tempo, os capitães-mores do Siará doavam terras no território que pertencia aos potiguares como no vale do Açu e no Seridó.

O presídio é, no entanto, construído e mantido pelo capitão-mor Sebastião Nunes Colares, governante do Rio Grande, e sua presença na região, junto com Pernambuquinho, permite a doação de 36 novas sesmarias entre 1709 e 1825.


Presídio de Pernambuquinho

Localizado na praia de Pernambuquinho, no atual município de Grossos, ele faz parte do mesmo esforço de proteção da região para onde a província do Rio Grande estava se expandindo, graças a doação de terras para a criação de gado. Pernambuquinho é instalada a margem oeste da barra do rio Mossoró, enquanto o Presídio de Mossoró é instalado na margem leste do mesmo rio. A localização, sem dúvida, tem como objetivo o controle da navegação e com isso combater, especialmente, o contrabando (a chegada e saída de produtos sem a cobrança dos devidos impostos para a coroa).

Ou seja, além da proteção dos colonos dos ataques indígenas, interessava a coroa portuguesa construir estes postos militares também para vigiar a população de origem portuguesa. No Sertão, distante do controle das autoridades constituídas pelo rei, era muito fácil desviar a parte que cabia ao monarca, com a vigilância dos presídios isso, com certeza, seria diminuído.

Ele provavelmente também foi construído em 1709, e continuou sendo utilizado até o século XIX. Em 1808, por exemplo, ele estava guarnecido com tropas, porém estas eram da Companhia de Sobral, sob o comando de Joaquim Ferreira de Araújo, já que aquela região permaneceu até o século XX em disputa entre o Rio Grande do Norte e o Ceará.


Presídio de Tibau

Localizado no município de Tibau, no morro que da nome a região, também conhecido como Morro das Areias Coloridas. Este é o acidente geográfico que determina os limites da capitania do Rio Grande do Norte.

O presídio tem sua construção iniciada em 1708, sob ordens do capitão-mor Sebastião Nunes Colares. A construção foi pedida pelo sesmeiro Gonçalo da Costa Faleiro que, em uma carta enviada ao rei português, relatou os perigos que vivia na região com os constantes ataques indígenas.


Para Saber Mais:

Augusto Fausto de Souza. Fortificações no Brasil.

Diogo Sylveyra Vellozo. Arquitetura Militar ou fortificação moderna.

Patrícia de Oliveira Dias. Onde fica o Sertão rompem-se as águas: processo de territorialização da Ribeira do Apodi-Mossoró (1676-1725)

Tyego Franklim da Silva. A ribeira da discórdia: terras, homens e relações de poder na territorialização do Assu Colonial (1680-1720)

Tyego Franklim da Silva. As bases do poder: os usos dos moradores como fundamento para a continuidade no poder na capitania do Rio Grande (1697-1700)